Arquivos da categoria: Artigos e Debates

Salário de Professor Adjunto 1 por R$ 12.197,45 na particular

Por Pierre Lucena – De Blog Acerto de Contas – Tenho falado bastante sobre a desvalorização salarial dos professores nas universidades federais. Inclusive apresentei um estudo mostrando que hoje um professor com doutorado recebe inicialmente menos do que no ano de 1998, durante o Governo FHC. De lá para cá, as carreiras foram progressivamente se recolocando no Governo Federal, à exceção dos professores universitários. Continuar lendo

Para onde vão as nossas universidades

artigo Ricardo Antunes. fonte: Folha de S.Paulo, 6/8/2012, p.A2

O ProUni fortaleceu faculdades de fachada. Já as federais, agora produtivistas,  não têm nem prédios. Mas vozes privatistas, “de mercado”, criticam a greve
A expansão do ensino superior durante os governos Lula e Dilma foi quantitativamente ampla, tanto para as universidades públicas quanto para as privadas.

O primeiro grupo vivenciou uma expansão dos campi muito significativa, através da profusão de cursos – muitos dos quais, entretanto, pautados pela razão instrumental, de qualidade duvidosa e em sintonia com a era da flexibilidade.

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Zero de conduta

Vladimir Safatle – Artigo publicado originalmente na Folha de São Paulo de 31/07/2012

Há mais de dois meses, os professores das universidades federais estão em greve. Após duas propostas consideradas insuficientes pela maioria do corpo docente, o governo parece disposto a endurecer as negociações. No entanto há de estranhar a maneira com que uma questão dessa natureza está sendo tratada. Continuar lendo

O passado dura muito tempo: notas sobre as ações antidemocráticas do governo Dilma na greve nacional das instituições federais

Por Roberto Leher (UFRJ)

A postura do governo Dilma frente à greve nacional dos docentes e, mais recentemente, dos técnicos e administrativos das IFES, não pode ser compreendida como uma mera contenda trabalhista. Se a greve é tão ampla, abrangendo 58 das 59 universidades federais, e foi capaz de lograr grande adesão interna, é porque conta com a adesão esclarecida de sua base. As vozes dos professores, animadoramente polissêmicas, convergem, de distintos modos, para a necessidade de um outro horizonte de futuro para a universidade pública, abrangendo a carreira, as condições de trabalho e o padrão remuneratório como fundamentos materiais da autonomia didático-cientifica das universidades.

De fato, o reclamo da falta de autonomia na definição dos cursos é geral, situação particularmente tensa nos novos campi em que cursos minimalistas, fast delivery diploma[i], nos moldes do bacharelado/licenciatura interdisciplinar, proliferam provocando insatisfação entre os docentes e estudantes. O mesmo sentimento de indignação frente à perda de autonomia está presente na pós-graduação, hiperintensificada e submetida, e ao heterônomo controle produtivista da CAPES que, cada vez mais, inviabiliza a produção rigorosa e sistemática de conhecimento e a formação verdadeiramente universitária de mestres e doutores.

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Governo reapresenta proposta e mantém a desestruturação da carreira

Em uma reunião que durou mais de cinco horas, representantes do governo apresentaram na tarde desta terça-feira (24) algumas modificações pontuais na proposta anterior e ajustes internos nas tabelas de vencimento básico e retribuição por titulação da remuneração dos docentes das instituições federais de ensino, todas expressas em valores nominais. O secretário de Relações do Trabalho, Sérgio Mendonça, iniciou a reunião afirmando que, na essência, a proposta não apresentava diferenças da anterior. Continuar lendo

O jornalismo cego às armadilhas do discurso oficial

fonte: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/_ed703_o_jornalismo_cego_as_armadilhas_do_discurso_oficial

O que dizer de um noticiário que dá de manchete exatamente o contrário da informação correta?

Foi o que ocorreu na cobertura da coletiva convocada pelo governo, no fim da tarde de 13 de julho, para anunciar a proposta com a qual pretende pôr fim à greve nas universidades e institutos federais de ensino, que já dura quase dois meses. O noticiário revelou mais uma vez a submissão dos jornalistas às fontes oficiais e a absoluta ausência de apuração própria resultou em matérias que induzem a erro e anunciam o oposto do que a proposta significa. Pois, em vez do alardeado reajuste, os professores terão perda salarial, como se verá. E não apenas isso: o plano de carreira embute armadilhas que, se confirmadas, significarão um retrocesso aos tempos da ditadura.

Comecemos, porém, pelos aspectos mais evidentes da cobertura.

Uma primeira comparação entre as capas de dois dos principais jornais do país já levaria a algum arquear de sobrancelhas: enquanto O Globo alardeia em manchete “Governo cede e aumenta professores em até 48%”, a Folha de S.Paulo dá chamada de capa com um índice menor: “Governo propõe reajuste de até 40% a docentes das federais”. A discrepância se deve a opções diferentes entre os jornais – o maior índice se refere a professores de institutos federais, e não de universidades – e ao cuidado do jornal paulista em abater, do índice anunciado, o reajuste de 4% já pago aos docentes de universidades no contracheque de maio, retroativo a março, conforme acordo estabelecido no ano anterior.

Ainda assim, ambos os jornais associam os números exuberantes aos cargos de “maior titulação”, sem explicar que esse reajuste máximo atinge apenas o restrito grupo de professores titulares. Entre doutores com regime de dedicação exclusiva, tanto adjuntos quanto associados (e essa diferença é relevante, porque os associados ganham substancialmente mais), o índice fica na faixa dos 30%.

Fazendo contas

Os jornais informam corretamente que os reajustes serão concedidos parcialmente, ao longo dos próximos três anos. Porém, não alertam para o essencial: que se trata de um percentual bruto, do qual, obrigatoriamente, deveria ser descontada a previsão de inflação para o período. E é aí que fica clara a primeira armadilha da proposta: não se trata de oferta de reajuste, mas da imposição de uma redução salarial, na maioria dos casos.

Há muitos anos, um renomado colunista de economia, convidado a dar uma palestra para estudantes de jornalismo, surpreendeu – e provavelmente decepcionou – a plateia ao responder à pergunta inevitável sobre a preparação dos jovens para a profissão: não repetiu a ladainha de sempre sobre a necessidade de leitura dos clássicos; disse que um bom jornalista precisa saber fazer contas.

Essa tarefa, infelizmente, continua restrita aos especialistas, como o professor Wagner Ferreira Santos, do Departamento de Matemática da Universidade Federal de Sergipe. Ele fez essas contas e disponibilizou o resultado num artigoem que demonstra o engodo de se comparar valores em períodos distintos sem considerar o índice de inflação correspondente, normalmente calculado pelo IGP-M. Com base nesse índice, ele projeta uma inflação de 20% até 2015, de modo que, assim (re)ajustada, a remuneração da grande maioria dos professores (mestres e doutores com dedicação exclusiva, que compõem a esmagadora maioria nas universidades públicas) sofreria, de fato, perda de 0,4% a 11,9%, conforme a titulação e o nível de carreira. Reajuste, a rigor, só para o professor titular (5,9%, nesse percentual corrigido) e para o doutor adjunto nível 4 (1%), como se pode conferir nas tabelas publicadas em seu artigo.

Para esclarecer, o professor argumenta, como se passasse uma tarefa a seus alunos: “Como exercício de fixação, façamos cálculos análogos com o salário mínimo, que é referência para a maioria da população brasileira. Primeiro, mostre que os atuais R$ 622 são realmente maiores que os R$ 510 de julho de 2010. Agora, a pergunta capciosa: se o governo anunciasse hoje que o salário mínimo sofreria aumentos consecutivos em três parcelas, chegando a R$ 700 em julho de 2015, você aceitaria?”.

Papagaios das fontes

Os jornalistas presentes à coletiva não apenas não fizeram essas contas como nem sequer indagaram por que a proposta anunciava percentuais brutos e ignorava a inflação projetada para o período. Seria o comportamento elementar de qualquer repórter minimamente qualificado e interessado em trabalhar com dados corretos para divulgar informações confiáveis. Ainda que se considere que o governo, espertamente, venha convocando suas coletivas mais problemáticas para o fim da tarde, quando já não sobra muito tempo para que os jornalistas analisem adequadamente os dados que precisam divulgar “em tempo real”, nos sites e no noticiário radiofônico e televisivo. Mesmo que não obtivessem a informação precisa, os repórteres poderiam relativizar o que receberam, e não agir como porta-vozes oficiosos. Entretanto, o máximo que fizeram foi ouvir “o outro lado”, o dos dirigentes sindicais, e publicar breves declarações contrárias à proposta, mas tampouco esclarecedoras.

À parte a questão do reajuste, que inevitavelmente ganharia destaque no noticiário, há pelo menos outras duas armadilhas embutidas na proposta do governo para o plano de carreira nas universidades federais, como se pode constatar aqui, e que sequer foram consideradas nas reportagens, como observou o professor Kleber Mendonça, chefe do Departamento de Estudos de Mídia da UFF. Uma delas, que já preocupava as entidades sindicais, é a de que todos os novos professores, independentemente de sua titulação, ingressarão no nível mais baixo da carreira, como auxiliares, e não poderão mudar de classe enquanto estiverem em estágio probatório (o período de três anos ao final do qual o profissional é confirmado ou desligado do cargo). Na prática, isso significa que aquele que já poderia estar recebendo como doutor ficará com remuneração inferior durante esses três anos. Note-se que os concursos, há muitos anos, vêm sendo abertos apenas para doutores, e só excepcionalmente para mestres. Ou seja, exige-se a titulação, mas a remuneração correspondente pode esperar.

É possível perder essa oportunidade tão clara de ironizar o discurso oficial de “valorização da carreira”?

Ironias da história

Além disso, a planilhacomparativa divulgada pelo governo mostra apenas os salários atuais (antes e depois do reajuste de 4% já concedido no mês passado, e retroativo a março) e os salários de 2015. O hiato de três anos até lá é apagado, mais ou menos como em certos anúncios imobiliários em que algumas ruas são suprimidas do mapa para dar a impressão de que o belo imóvel fica a poucas quadras da praia ou de um maravilhoso bosque. Quem olha as planilhas fica com a sensação de que os professores que recebem hoje, digamos, R$ 7.600 (adjunto 1, doutor com dedicação exclusiva), passarão logo a ganhar R$ 10 mil, quando esta é a remuneração para daqui a três anos.

A outra armadilha é que o governo propõe uma mudança no sistema de promoção “nos termos das normas regulamentares a serem expedidas pelo Ministério da Educação”. Portanto, propõe que os professores aceitem normas que desconhecem.

É de fazer inveja a Maquiavel.

Mas essa armadilha representa algo ainda mais grave, como lembrou o jornalista João Batista de Abreu, professor no Departamento de Comunicação da UFF: significa um retorno aos tempos da ditadura militar, quando não havia concursos públicos e a cada renovação de contrato os professores tinham que apresentar o famigerado atestado ideológico, emitido pelo DOPS. Quem estava respondendo a processo político não conseguia o documento. Depois da Lei da Anistia, em 1979, essa exigência caiu, mas um chefe de Departamento que não gostasse de determinado professor poderia simplesmente não renovar seu contrato.

João Batista, na época em início de sua carreira docente, recorda da greve iniciada em fins de 1980, que resultou na conquista desse aspecto fundamental da autonomia universitária que é a definição do sistema de ascensão funcional, através da constituição de comissões de progressão docentes, responsáveis também pela regulamentação das atividades do professor na instituição. “Se os critérios de progressão passarem a ser definidos pelo MEC”, diz João Batista, “voltaremos 30 anos no tempo”.

Seria uma dessas ironias da história se isso acontecesse, tendo em vista o passado dos atuais governantes. Mas a tentação autoritária é um fantasma sempre à espreita.

“Proposta definitiva”

Apesar de todas essas considerações, houve quem, embora com vasta experiência profissional – como a colunista de política da Folha Eliane Cantanhêde –, optasse por simplesmente reverberar as informações oficiais, afirmando tratar-se de uma “proposta definitiva”, esse absurdo lógico que ignora que uma proposta, por definição, é passível de negociação. Do contrário, trata-se de decisão, deliberação, imposição ou qualquer outro substantivo que expresse uma resolução unilateral de quem tem, ou pensa que tem, poder para agir dessa forma.

Para concluir, as reportagens não deixaram de notar o “impacto” de R$ 3,9 bilhões que essa “proposta definitiva” causará aos cofres públicos, ignorando oportunamente o teor da Medida Provisória 559, já aprovada pelo Congresso e dependendo apenas da sanção presidencial, segundo a qual o governo concede às instituições particulares de ensino R$ 15 bilhões sob a forma de renúncia fiscal.

Assim se faz o jornalismo de hoje, esse jornalismo que certa vez chamei “de mãos limpas”, porque se contenta em ouvir um lado, ouvir outro e lavar as mãos, deixando supostamente a conclusão para o público. Não é difícil imaginar a que tipo de conclusão esse público poderá chegar, privado que está das informações elementares a partir das quais poderia elaborar algum raciocínio minimamente fundamentado. Não por acaso tantos colegas professores receberam congratulações de parentes e amigos diante da expectativa do magnífico reajuste. Precisaram pacientemente desfazer o equívoco, para espanto de quem acreditou nos jornais.

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[Sylvia Debossan Moretzsohn é jornalista, professora da Universidade Federal Fluminense]

Marinalva Oliveira: Crise internacional não justifica precariedade nas universidades federais

por Luiz Carlos Azenha

A presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES), Marinalva Silva Oliveira, disse ao Viomundo que a crise econômica internacional não pode ser usada pelo governo Dilma como argumento para deixar de atender as reivindicações de professores e estudantes das instituições públicas federais de ensino que estão em greve.

A paralisação de professores e técnicos começou em 17 de maio, em torno de duas reinvidicações básicas: a reestruturação das carreiras, com piso salarial de R$ 2.300 e melhorias na infraestrutura. Na primeira reunião entre grevistas e representantes do Ministério da Educação, em 12 de junho, segundo Marinalva o governo pediu trégua, mas não ofereceu “nada objetivo, nada preciso”.

Fatos: houve grande expansão das universidades federais, com o número de estudantes saltando de 653 mil em 2008 para 850 mil em 2010.

O orçamento para investimento e custeio também cresceu, de R$ 3,9 bilhões em 2008 para R$ 7,7 bilhões em 2012.

Ainda assim, na avaliação da presidente do ANDES, “foi uma expansão precarizada”.

Ela afirma que os problemas se acentuaram desde o início do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni).

Diz que os salários atuais não são capazes de atrair bons quadros para dar aulas em universidades federais.

Marinalva, que é doutora, professora em dedicação exclusiva e associada 2 — faltam apenas 4 anos para chegar ao topo de carreira — ganha 8 mil reais liquidos.

“Se você comparar com outras carreiras do Executivo, é um dos [salários] mais baixos. Nós que formamos os mestres, os doutores, fazemos pesquisas”, afirma.

Sobre a adesão dos estudantes ao movimento — de mais de 40 universidades –, ela atribui isso à má qualidade da infraestrutura:

“Nós temos turmas superlotadas, chega a 80 alunos numa sala de aula”.

 Alunos reclamam da falta de laboratórios, restaurantes, creches e professores.

As bolsas de trabalho para estudantes que substituem técnicos administrativos, segundo Marinalva, “são irrisórias”.

Os professores são forçados a buscar financiamento para pesquisas muitas vezes em “entes privados, ameaçando nossa autonomia intelectual”.

O ANDES defende a expansão das universidades federais, “mas com qualidade”.

Sobre a crise internacional, Marinalva argumenta que há dinheiro, por exemplo, para as obras da Copa do Mundo. Alega também que o governo não vê problemas em dar isenção fiscal a empresários e lembra o caso da dívida tributária das universidades particulares, que atingiu R$ 17 bilhões. Uma proposta de renegociação daria a elas o direito de pagar 90% em bolsas de estudos e os outros 10% em 15 anos.

Quanto às negociações, a presidente do Andes diz: “Temos interesse em encerrar essa greve, mas desde que o governo nos receba, analise nossa proposta”.

Marinalva Oliveira: Crise internacional não justifica precariedade nas universidades federais

O que quebrará o País?

Por Vladimir Safatle

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou nos últimos dias que a elevação dos gastos com a educação ao patamar de 10% do Orçamento nacional poderia quebrar o País. Sua colocação vem em má hora. Ele deveria dizer, ao contrário, que a perpetuação dos gastos em educação no nível atual quebrará a Nação.

Alunos de universidades públicas de todo país se reúnem em frente ao Museu Nacional da República para reivindicar uma audiência o ministro da Educação, Aloizio Mercadante. Foto: Agência Brasil

Neste exato momento, o Brasil assiste a praticamente todas as universidades federais em greve. Uma greve que não pede apenas melhores salários para o quadro de professores e funcionários, mas investimentos mais rápidos em infraestrutura. Com a expansão do ensino universitário federal, as demandas de recurso serão cada vez mais crescentes e necessárias. Isto se quisermos ficar apenas no âmbito das universidades públicas.

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Sugestões de providências durante e depois da greve

Artigo da Subcomissão de Comunicação do Comando de Greve da Unifesp Diadema

 O momento de enfrentar os desafios postos pela decisão democraticamente constituída de deflagrar e sustentar uma greve exige tanto dedicação e esforço quanto cuidados e precauções.

Dedicação e esforço no sentido de

  • compreender o sentido de participar de um processo democrático em plena ebulição ativado pela circunstância de uma greve;
  • constituir um lugar de fala que seja legítimo e esteja ajustado às dimensões públicas e democráticas instauradas pela greve;
  • assimilar a prática de procedimentos que sejam solidários com as necessidades de solucionar e/ou atenuar as dificuldades e os desequilíbrios que a greve revela e contra os quais luta no tecido das relações, institucionais e pessoais;
  • entender que não há possibilidade de estar “fora” da greve;
  • assumir as responsabilidades e os compromissos diante de todos os encaminhamentos elaborados coletivamente;
  • manifestar-se, pois temos todos o poder de expressão garantido em todos os fóruns legítima e democraticamente constituídos.

 

Cuidados e precauções no sentido de

  • nos unirmos no momento em que a necessidade de defender uma educação de qualidade exige nossa intervenção;
  • cultivar e manter relações de respeito, tolerância e colaboração com todos os envolvidos;
  • identificar a necessidade de expressão e participar da constituição do lugar legítimo de sua manifestação;
  • não permitir o agravamento das circunstâncias acarretado por desinformação, boatos e falsificações;
  • nos mantermos bem informados e conscientes de que a situação nova que a greve gera é uma oportunidade para compreender melhor as forças políticas envolvidas no campo da educação;
  • ter clareza de que as soluções dependem sobretudo de ação conjunta colaborativa e esclarecida.

 

Assim será possível preservar as boas relações profissionais e ideológicas que nos unem no verdadeiro espírito universitário que deve reger a construção de uma universidade pública, gratuita e de qualidade para todos.

 

Uma tremenda e inadmissível falta de Educação

Artigo da Comissão de Comunicação do Comando de Greve de Diadema/Unifesp

 

“Nenhum teste de sociedade justa é tão claro e decisivo como a sua propensão em tributar para desenvolver e sustentar um forte sistema educacional para todos os seus cidadãos.”
[John K. Galbraith, A sociedade justa: uma perspectiva humana, p.83]

Todos os que trabalham e se interessam pela construção da universidade pública universal, gratuita e de qualidade sabem que vivemos hoje sob uma política de desqualificação sistemática da atividade docente proveniente, por um lado, pela opção política de manter um superávit primário com vistas ao pagamento dos juros da dívida pública e, por outro, pela incompetência administrativa do governo para com os assuntos da educação.

Desde 2011, foram feitas insistentes propostas ao Ministério da Educação de revisão do plano de carreira dos docentes das Universidades Públicas Federais, de exigências de cumprimentos dos acordos e prazos para realização de obras de infraestrutura e de constituição de equipes de estudos e discussão para consolidar com qualidade a expansão do ensino superior federal. Todas as propostas foram invariavelmente desprezadas pelo governo, o que nos levou a instaurar, democraticamente, o processo de deflagração da greve nacional como meio de sensibilização e envolvimento de todos diante de tão emergencial situação. E, como vemos, a adesão é quase total: 56 das 59 universidades federais estão em greve. Docentes, estudantes e funcionários já formam comitês unificados de reivindicação em quase todos os estados do Brasil.

Para nós, a greve além de legítimo instrumento de mobilização e reivindicação, é importante ocasião de educação política, de organização das categorias envolvidas no trabalho universitário e de constituição de reflexão crítica coletiva sobre as relações entre educação, sociedade e políticas de Estado.

A greve representa hoje um regime de exceção dentro de outro. É, por isso, uma oportunidade para compreender a conformação que resulta na atual política educacional. A excepcionalidade que a greve instaura permite modificar o ponto de vista a partir do qual nos vemos em permanente atrelamento durante a vigência da chamada “normalidade”. Essa espécie de abalo permite que se ofereçam as condições para pensar de outro modo o curso dos acontecimentos, inclusive as forças que os determinam e as que resultam em consequências. E disso sobressaem, inclusive, os sentidos políticos que erigem como “natural” o que na verdade é “escolha”, portanto, construção interessada e orientada por preferências e decisões, dentre outras, de natureza política.

Nosso problema (de todos) tem sido que essa construção do real se pauta por e se caracteriza como um estado de exceção permanente, e se constitui como o paradigma dominante para os governos na política contemporânea. Que outro motivo seria tão determinante do desrespeito sistemático dos direitos humanos em tão variadas e amplas esferas? Que outra razão explicaria que os seres humanos (quando não considerados como meros consumidores) tenham se tornado um estorvo em muitos projetos, sejam mercantis, científicos ou políticos?

É disso que se está falando quando se torna “natural” passar a responsabilidade total pela carreira dos docentes, por exemplo, ao departamento financeiro da União. É disso que se trata quando vamos nos acostumando com a precariedade como dado “normal” na Educação brasileira. É contra isso que nos manifestamos quando mudamos o rumo dos acontecimentos instaurando um processo democrático, social e político de reflexão sobre uma ordem que gera incessantemente descalabros e aprofunda cada vez mais o que de pior se produziu em matéria de política e de educação na história.

A circunstância que deixa pessoalmente muitos docentes indignados, seja pela carência ou inexistência de suas bibliotecas, de seus laboratórios, de suas salas de aula, das instalações, enfim, de seus campi constitui-se como um momento no sistema conjunto de uma cultura que desqualifica toda a Educação e, em particular, todo o trabalho docente, cultura na qual, segundo Adorno, “o professor se converte lenta, mas inexoravelmente, em vendedor de conhecimentos, despertando até compaixão por não conseguir aproveitar melhor seus conhecimentos em benefício de sua situação material.”

No entanto, isso deve servir para que cada um, individualmente, compreenda que para além das mazelas imediatas que nos cercam há questões de fundo a determinarem todas essas precariedades, e a ocasião da greve representa o momento oportuno de enxergamos um pouco mais adiante no sentido dessa radicalidade que poderá, se nos mantivermos unidos, constituir uma experiência engrandecedora de luta coletiva e um verdadeiro e inédito avanço das forças educacionais na ainda triste história deste país.

Nosso apelo, por isso, é no sentido de união, tanto dos docentes quanto de estudantes e técnicos administrativos, de ampliação e aprofundamento do debate, de estudo das propostas e das alternativas, de esclarecimento dos eixos de reivindicação e da consolidação dos canais que têm permitido a formação de uma atmosfera intelectual crítica de atenção para com os meandros decisórios que resultam nas políticas de Estado para a educação e para a universidade no Brasil.